quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Ao encontro do tenente-coronel

O tenente-coronel Pinheiro Neto esperava-me no alto do seu "posto de vigia". Enquanto isso, eu andava em aventuras mirabolantes para ir dar com o Bope. Peguei o ônibus e dei por mim a dizer à mulher que recebe o dinheiro dos bilhetes: "podjia ávisá pra mim lá nas Laranjeiras?". Não foi a primeira vez que usei este sotaque inconscientemente. Já quando esperava na terminal do Tietê para vir para o Rio fui a correr atrás de uma senhora cujo casaco tinha caído e disse-lhe: "ó aí... o casaco caiu pra você".
Sinceramente, eu não sei se eles fazem tudo "pra mim" ou "pra você", mas devem usar estas expressões com frequência, para que eu já as tenha apanhado. Ridículo. É que cansei de impôr o meu sotaque de portuguesa e ter que repetir as coisas milhões de vezes até que eles percebam (só quando dou uns ares de brazuca).
No entanto, ando também algo surda, sobretudo depois da viagem de autocarro por montes e vales até aqui. Acontece que a senhora que cobra os bilhetes diz que perguntou quem ia sair nas Laranjeiras e ninguém respondeu. Quando lhe pedi que não se esquecesse de "avisar pra mim" (já estava há uma hora e meia no autocarro), ela riu-se e explicou que já tinha perguntado, não se lembrava já quem tinha pedido isso.
Acontece que fui parar à Rodoviária, a última paragem daquele transporte, e tive que pagar a viagem de regresso e estar muito, muito atenta para não perder de novo o objectivo. A senhora que cobra os bilhetes (agora já era outra) lá me avisou. E eu saí. Andei em direcção à Rua das Laranjeiras, nº 150. Deparei-me com um condomínio fechado, um prédio normal... Não, não podia ser aquilo. Nisto, já passavam 10 minutos da hora marcada com o tenente-coronel que me esperava.
Perguntei a várias pessoas se sabiam onde era o Bope, até que, já eu estava desesperada, um senhor da vidreira soube dizer-me. Eu tinha a morada errada, sim. Era lá ao cimo, no morro. Andei uns trinta minutos, o mais rápido possível. Subi a ladeira pelo parquezinho e depois mais umas ruas desertas. Estava um calor desgraçado e eu suava em bica. Estava muito vermelhinha e ofegante, coisa que já não sentia desde as longínquas aulas de educação física. E só pensava "não, eu é que não era boa para ir para o Bope, de certeza".
Enfim, vi a caveira que caracteriza os "caveirinhas". Dois tropas à entrada perguntaram-me quem eu era, avisaram a minha chegada e lamentaram, mas eu ainda tinha bastante para subir. Ainda foram mais uns 10 minutos a pé, sempre a subir, até entrar finalmente na sede do Bope. E o tenente-coronel continuava à espera. Levaram-me até ele. Bem mais simpático e sorridente do que eu esperava, depois de falar com ele por telefone e ouvir aquela forma de falar de tropa.
Mas ele ia ter uma reunião. Por isso sentei-me à espera que a reunião terminasse. Deram-me água porque viram o meu estado de exaustão, além das olheiras que já trazia de uma noite mal dormida (não sei se cheguei a dormir) no autocarro da '1001'.
Enquanto isso, reparei na lindíssima vista que eles têm lá de cima. Vêem o Cristo, o Pão de Açúcar, a Baía de Guanajara, o palacete do governador... Upa, upa! Assim dá gosto! Perdida nesta paisagem lá entrei no gabinete do comandante, o tenente-coronel Pinheiro Neto - já passava das 16 horas... Falei com ele, super simpático, era novinho... Depois subiu comigo ao telhado para me mostrar o outro lado da vista... a favela. E contou-me que eu andei sozinha numa favela, embora fosse a parte mais deserta. Nossa! Descansou-me o facto de ser "a favela mais segura do Rio" e que "os meninos de sete, oito anos, não sabem o que é uma arma, não sabem o que é um traficante, nunca sentiram perigo". Porquê? Foi há sete, oito anos, que o Bope ali se instalou.
Bem, tirei as minhas fotos, admirei o "caveirão" (o blindado deles), e um moço que trabalha para o coronel deu-me boleia para descer a favela no carro do Bope. De volta às Laranjeiras, senti que ficou um monte de gente a olhar para mim, provavelmente a pensar que tipo de crime é que eu tinha cometido para vir naquele carro.
Voltei facilmente a Ipanema, debaixo de uma chuva intensa que começou a cair quando eu estava no telhado do Bope. Sentia-me tão, tão cansada. Ainda por cima, durante a manhã, tinha andado a fazer uma grande passeata pelo paredão de Ipanema até chegar a Copacabana e estar mesmo a chegar a Botafogo. Ainda assim, para aproveitar bem estes momentos cariocas, decidi passear aqui por Ipanema na hora de jantar. Gosto mais do que Copacabana, onde fiquei da outra vez que vim ao Rio. Se alguma vez vierem ao Rio, é... Ipanema é o mais fixe!
Às 21 horas cheguei à pousada, que é estranha, para dormir o mais rapidamente possível. Todas as pousadas aqui são estranhas, parece-me. Cada uma com suas especificidades. Depois mostro a foto da entrada. É que tem uma portinha com um buraco para espreitar. Parece aqueles filmes em que há um guarda do outro lado da porta que pede uma senha de entrada na casa de jogo ilegal. Mas é giro!
Hoje vou passear mais um pouco por aqui, entrevistar mais umas pessoas e, provavelmente, ainda dou um salto a Niterói para ver o famoso Museu de Arte Contemporânea, partindo então de Niterói para São Paulo. Não quero voltar a São Paulo!! É feio, escuro, poluído, instável, stressante... E aqui é tão bonitoooo!!

2 comentários:

Unknown disse...

Ai melher onde andas tu metida??? Jasus... olhá cê tein de tê cuidádu aí... bêjo grandi

Anônimo disse...

"as aventuras de helga costa" - dava um livro
beijinho!