domingo, 2 de dezembro de 2007

Tios em acção

Fui visitar o Museu da Independência. Adivinhem com quem? Com o tio Anastácio.
Cheguei atrasada (30 minutos atrasada, depois de grandes correrias pela manhã). Entrámos no museu, ele não paga porque é da terceira idade e decidiu pagar a minha entrada. No fundo, não vi nada do museu. O tio Anastácio queria mostrar-me as coisas realmente interessantes ali dentro. Primeiro, subimos a escadaria do edifício que ele jura a pés juntos que nunca foi um palácio. "Que palácio? Isso é um museu, então...!". Mas aquilo para mim era um palácio, com aqueles jardins típicos, os rebicoques sumptuosos. E já confirmei que sim, foi um palácio em tempos. Bom, enquanto subíamos a escadaria observávamos os retratos expostos nas paredes. O tio Anastácio fazia questão de me dizer quem era o D. Pedro I (do Brasil) e a Dona Leopoldina. Como se eu não soubesse ler aquilo que estava lá escrito com letras bem gordas.
Chegámos ao piso superior e entrámos nas várias salinhas. Qualquer que fosse a coisa exposta ele fazia questão de me explicar: "olha, olha aí, isso eram as espadas e as armas... eles antes não tinham pistolas... ah e aquilo ali é aquilo que os soldados vestiam, as arma... arma, já não sei como se chamam". Começavamos bem. De qualquer das formas, ele achava que aquilo não era importante. Queria rapidamente mostrar-me aquilo que ele chama o "quadro da independência". Finalmente entramos na sala onde estava o dito cujo, que afinal não era mais do que um quadro maiorzinho chamado "Independência ou morte", que representava a cena da independência - tal como os outros. E sempre, em todos os quadros, ele dizia-me qual ali daquelas figuras era o Dom Pedro.
O resto do piso era dedicado ao mobiliário da côrte. "Olha a cama da Dona Leopoldina!". Todas aquelas coisas eram, segundo o meu tio, pertencentes à Dona Leopoldina... mesmo que lá estivesse a dizer que pertenciam à condessa santa não sei quê, ou a outra pessoa qualquer.
Até aí tudo bem, apesar de sentir que ele era a entropia principal na informação que recebia (agora percebo mesmo o que é entropia), e apesar de não ter tempo para ler as explicações, porque o tio Anastácio contentava-se com a explicação que ele próprio concebia. Às vezes, ele até lia qualquer coisa - o nome dos quadros, leu-os todos com alguma dificuldade em voz bem alta, para que todos soubessem o quão culto ele é; as datas, essas, também repetia em voz alta, essas já mais rapidamente. Até numa salinha em que havia um filme sobre um quadro com uma voz-off e, além disso, com as legendas daquilo que a voz-off dizia, ele conseguia repetir as datas e explicar o que estava a acontecer: "Olha, quando o filme pára aqui, acende ali a luz no quadro", explicava, conhecedor, quando se apercebeu que isso acontecia (escusado será dizer que já toda a gente tinha percebido isso). Os comentários do tio eram cansativos.
Mas só depois de tudo isto é que as frases mais chocantes foram proferidas. Enquanto víamos o mobiliário, segundo ele, da dona Leopoldina, sai-se com esta pérola: "Ah, mas que interessam os móveis, nunca se sabe se eram desse tempo ou não... eu não acredito, depois de tanto tempo já tinham virado farelos... eles de certeza que fazem uns novos, mas a gente não sabe". Tentei explicar-lhe que havia formas de proteger os móveis, para que não se degradassem tão rapidamente, mas ele disse que "essas coisas pra proteger não servem de nada, filha". Imediatamente a seguir, lá vem com mais uma informação. É que no Museu de Ipiranga há muito turista... Jura? Um museu com turistas?? Não digas!!... "é, essa garotada toda aí não é daqui, quer ver?". Então o tio adoptou uma técnica especial. Podia perguntar simplesmente de onde vinham, para me provar de que estava certo. Mas não. Vejam a aproximação que ele fez a uma miúda: "Oi, chega aqui ó moça!", gritou. Quando ela se aproximou, lá vai disto: "Ocê quer ser minha namorada?". Claro que a garota ficou envergonhada. Mas, ainda assim, em vez de lhe mandar uma chapada, riu-se, disse qualquer coisa que não percebi e só depois o tio perguntou de onde eram. Por acaso eram de São Paulo, ou seja, tanto ele como eu estávamos errados.
Depois de termos já visto a pintura que ele tanto me queria mostrar, apressávamo-nos agora na procura da sala do dinheiro. A partir da parte dos armários, aí é que não vi mesmo mais nada. Já mais nada interessava e o tio afirmou mesmo várias vezes que "interessa ver é o dinheiro, quero ver o dinheiro, pô, onde é que tá?". É... Não vi mais nada porque, afinal, a sala das moedas não apareceu porque, afinal, o museu foi assaltado.
Saímos enfim do museu em direcção a casa dele para encontrar a tia Conceição e lá me oferecerem o almoço. Saímos do jardim anexado ao palácio e fico surpresa quando vejo que o tio conhece toda a gente ali. E então percebi que ele vende ali sucos, refrigerantes, águas, "até água de côco eu vendo ali". Já não tem a padaria! Passámos no supermercado para comprar um frango e seguimos em paz, até ao enfim reencontro com a tia fortona.
As discussões entre os dois são surreais. Cada um mais "cabeça-dura" que o outro. "Você foi buscar o frango aí?? Eu disse pra ir naquele lugar em que também vem a farofa e a batata, Anastácio!". E comenta mais baixo, para mim- "faz tudo ao contrário". Mas prossegue: "aaahhh, você não mandou cortar o frango, meu deus? eles cortam tão direitinho!!! eu não pedi pra você mandar cortar ele?". Uma série de reclamações por aquilo que o tio Anastácio fez naquele dia. Mas o também conhecido por portuga ou Almeida (descobri hoje), não fica atrás nas implicâncias. "Ainda não fez o almoço, mulhé?" ou "Pára de falar bobeira" são algumas das frases mais citadas pelo tio.
Tentei apaziguar o ambiente. "Então, tia, não veio connosco ao museu? Pensei que também ia!". Mas devia ter estado calada. Enquanto ela dizia que o tio não lhe disse pra ir e que ele nunca quer ir passear com ela, o tio dizia que ela tinha que ficar a fazer o almoço, de outra forma, quem o faria? Então, preferi manter-me mais calada. Quando um se ausentava, o outro pedia-me para não ligar às "bobeiras" do outro. Uma confusão.
Entretanto, o tio insistia que eu bebesse cerveja, vinho, cachaça... Mas eu recusava sempre... Se tivesse aguinha preferia, que até estou com sede. Sim, estão a imaginar-me a beber cachaça às 11h30 da manhã... lol "Ah, mas caipirinha você tem que beber... vai beber uma caipirinha como nunca bebeu, que eu faço uma especial". Continuei a recusar, justificando que ia trabalhar à tarde e que não me ia pôr ali a beber. Mas teve que ser... Ele fez mesmo a caipirinha por minha causa, misturou pra lá umas coisas que eu não sei o que é, e ainda me chega a tia Conceição com uma coisa chamada "Pinga da Roça", uma bebida típica de Minas, que eu tinha que provar... Conclusão, ali em jejum já nos copos... Aquela pinga da Roça é forte que dói, tipo cachaça, nem sei se é cachaça, e mais uma data de bebidas na mesma caipirinha muito doce... A minha mãe diz-lhes!! Depois chegou a hora de comer e fui obrigada a comer uma refeição que daria para três ou quatro pessoas... Já empanturradíssima, o tio continuava a pôr-me frango, a tia queria fazer mais massa, depois de um prato a abarrotar. Ainda assim, fui obrigada a comer quatro rodelas de abacaxi na sobremesa e a provar um pouco da carne em vinha de alhos (como um lanche que se cruza com o almoço) super salgada que a tia tinha acabado de fazer.
Alguma coisa má esteve prestes a acontecer. Agora percebo a falta que faz um vomitório... Estava mesmo mal disposta. Fui passear com a tia, a ver se fazia a digestão. O tio ficou de ir ter connosco, mas não o encontrámos. Regressámos a casa, lá estava o tio. A ideia era eu ter ido directa para casa. Mas estou aqui e ainda não fui a casa. Acontece que a tia achava que eu ia passar o dia todo com eles, e até mesmo que lá dormiria. Esta mulher tem um qualquer tipo de problema e, concerteza, sente falta de passear e falar com pessoas. Expliquei-lhe que tinha uma reportagem para fazer e que ainda tinha muitos planos para hoje. Disse-lhe que ia para a Liberdade, e tinha mesmo que lá ir, embora a minha vontade naquele momento fosse ir para casa dormir. Ela fez questão de me acompanhar. Pediu ao tio que nos levasse ao metro de carro. Sim, andei naquele carro fantástico outra vez e voltámos a ficar atravessados na estrada... e percebi que o condutor também não ajuda muito à prestação do bolinhas. A tia fez questão de berrar para dentro da Casa de Portugal (onde eu ia falar com pessoas como jornalista) a dizer "óóóóhhh, vem cá, ela qué fazê umá perguntá prá você". E ausentou-se... Que vergonha!!! Mas quem a mandou? Eu ia despedir-me dela, despachá-la, e depois, aí sim, ia tratar das coisas de forma civilizada. Não queria esta entrada espampanante. Expliquei ao senhor o que queria, ele mandou-me entrar, era de Aguiar da Beira, lá em Viseu, e super simpático. Nem sequer pus em questão chamar a tia para entrar. Para passar vergonha, já chegava. Ela estava a ver qualquer coisa do outro lado do passeio quando eu entrei. Já lá dentro há um pouco, ouvi um berro da tia, do lado de fora. Disse adeus e mandou-me um beijo. Não tem noção das coisas!!! E foi embora...
Ela já sabe que quando eu lá voltar vai fazer bacalhau para mim. Ai, mas eu nem vou perder tempo a ir lá, tenho mais que fazer...

Um comentário:

Unknown disse...

Helguinha faz parte da tua obrigação blogueira voltares à tia fortona e ao teu tio k é um must... coitadinhos são expansivos... imagino é só rir, e tu dentro do filme de terror/comédia... jokas e mandame o teu nib jinhos